O tema dos
distúrbios alimentares ainda é um tema complexo para muita gente porém senti
que ao escrever sobre ele poderia contribuir para que algum de vós que já tenha
vivido um distúrbio alimentar ou esteja a trabalhar na sua superação, ou que
conheça alguém a passar pelo processo possa sentir-se mais apoiado e saber que
não está sozinho/a. Sair deste círculo vicioso não é fácil - implica saber
pedir ajuda, ter o apoio de uma equipa multidisciplinar (medicina tradicional e/ou
complementar), e otimizar a força de vontade para lidar com as recaídas – mas é
possível!
Vou contar-vos a
história de Joana.
Joana passou
pelo divórcio dos seus pais quando tinha 12 anos o que na altura até lhe pareceu
ser positivo na medida em que a tensão em que viviam a incomodava mais do que a
ausência posterior do seu pai na casa onde tinha ficado a viver com a mãe e
irmã. Aos 15 anos foi-lhe diagnosticada Anorexia Nervosa após ter chegado aos
46 kg e continuar a achar que estava gorda.
Joana recorda-se
de estar no 9º ano de escolaridade e sentir uma tendência brutal para se
isolar, para se refugiar no estudo e achar que a turma daquele ano letivo não
gostava dela.
Recorda-se de
ter tido grande dificuldade para se relacionar com as pessoas da sua idade
durante aquele período da sua vida. Nas refeições em família Joana aproveitava as
idas da sua mãe à cozinha, para colocar no guardanapo a comida que tinha no prato
e em seguida ia deita-la na sanita. Fazia de tudo para não aumentar nem 1 grama
de peso! A obsessão pela contagem de calorias era superior a si e estava
determinada em controlar rigorosamente a ingestão de qualquer caloria que
ultrapassasse o limite diário definido por si.
Nessa altura a
família ficou desesperada, em particular a sua mãe. Joana recorda-se de ter tido
uma infeção bacteriana resultante de uma profunda baixa de defesas do sistema
imunitário e que se manifestou por bolhas em toda a pele fazendo-a parecer-se
com um bicho. O seu cabelo estava sem brilho, tinha umas olheiras até aos pés, e
da menstruação nem sinal! A sua mãe já em desespero resolveu tirar uma
fotografia às costas de Joana num momento em que esta se encontrava a tomar
banho. O seu objetivo era mostrar-lhe aquilo em que o seu corpo cadavérico se
estava a transformar, na expetativa de que a sua filha tivesse uma verdadeira
tomada de consciência. Não resultou pois a distorção da sua imagem corporal era
tão grande que Joana continuava a ver-se gorda. Um dia levantou-se da cama e
pelo estado desnutrido em que se encontrava desmaiou e fraturou o nariz. Nessa altura
ficou em casa a recuperar não indo à escola durante algum tempo. Qual não foi o
seu espanto quando os seus colegas de turma e uma professora lhe foram fazer
uma visita levando flores e chocolates. A “sua” anorexia terminara ali. A
consciência do mal que se infligia e o carinho e atenção recebido pelos colegas
foram a fórmula perfeita para decidir que não queria mais aquilo para si.
Manteve-se sem
perturbações alimentares durante alguns anos porém, após duas grandes perdas na
sua vida, aos 25 anos regressou aos distúrbios alimentares, desta vez sob a
forma de bulimia. Joana tinha episódios de ir à pastelaria comprar bolos de
propósito e de os devorar em minutos, em seguida era acometida por um
sentimento de culpa imenso e voava para o WC para provocar o vómito de tudo o
que tinha ingerido.
Este hábito de
comer compulsivamente e em seguida vomitar levava a que tivesse muitas vezes as
glândulas salivares inchadas, retenção de líquidos, arritmias e tensão baixa.
Embora tenha uma relação delicada com a comida, Joana decidiu superar estes
distúrbios e hoje faz vigilância cerrada à sua mente comprometendo-se a evitar qualquer
gatilho que despolete comportamentos autodestrutivos.
Esta história é
apenas uma de muitas que existem e se mantêm no silêncio pois quem sofre de
anorexia, bulimia ou de outros distúrbios alimentares esconde muitas vezes o
seu comportamento por ser acometido de sentimentos de culpa.
O que são então
os distúrbios alimentares?
Os distúrbios alimentares como a Anorexia
Nervosa e a Bulimia Nervosa caracterizam-se por ser perturbações no
comportamento alimentar. São doenças psicológicas e embora existam outras
vou-me circunscrever a estas duas perturbações.
Ambas têm em
comum a preocupação excessiva com o peso e com a busca de um ideal de corpo
perfeito mas enquanto a primeira se caracteriza por uma perda de peso intensa
resultante da intenção de não comer e de uma distorção da imagem do corpo, a segunda
corresponde a uma ingestão excessiva de alimentos num curto espaço de tempo e
de forma compulsiva seguida por vómitos autoinduzidos ou uso de medicamentos
para manter o peso controlado (Cordás, 2004)[1].
Estas não são
doenças da moda, são doenças silenciosas e que efetivamente afetam a vida de
muitos jovens e adultos, em especial das mulheres, e por consequência das suas
famílias. Digo silenciosas pois muitas vezes a família e amigos nem imaginam o
que se passa, desconhecendo a razão pela qual o/a doente evita refeições em
grupo, porque corre para o WC a seguir a uma refeição, etc…
Segundo a Dr.ª
Isabel do Carmo (2016)[2],
do serviço de Endocrinologia do Hospital de St. Maria em Lisboa foi feito um
estudo em escolas secundárias nos distritos de Lisboa e de Setúbal que revelou
que 1 em cada 200 raparigas sofrem de anorexia. Na população universitária 3 em
cada 100 sofre de bulimia. É caso para se refletir e ter uma ação preventiva
ficando-se atento aos sinais desde o inicio.
Não paramos para
perceber o que nos leva a comer compulsivamente nem para identificar os
gatilhos emocionais que nos conduzem a uma anorexia e/ou bulimia e às
compulsões alimentares, e esse é meio caminho andado para desenvolver estas
perturbações. Consciente disto, Deepak Chopra[3]
(2014, p.13), no seu livro Tem fome de
quê? refere que a solução para uma
alimentação saudável é “transformar a sua consciência”.
É impossível ter o controlo de todos os
sentimentos e emoções que se vivem porém podemos aprender a gerir os
pensamentos e a evitar os gatilhos emocionais que conduzem às compulsões
alimentares.
Algumas
dicas que poderão ajudar a evitar os distúrbios alimentares ou os gatilhos que lhes dão origem:
- Procurares ajuda especializada (médica e terapias complementares);
- Tornares-te consciente - identificares a emoção que sentes antes de ter o impulso para a compulsão;
- Perceber se realmente sentes fome ou é apenas um impulso fruto de um estado emocional (tristeza, ansiedade…);
- Beberes 1,5L litro de água/chá por dia para manter o estômago com sensação de saciedade;
- Promoveres o teu bem-estar emocional;
- Aprenderes a gerir o stress recorrendo à meditação e ao relaxamento;
- Fazeres exercício físico;
- Falares sobre o assunto com alguns familiares e amigos;
- Fazeres atividades que te tragam alegria (Exemplo: caminhar na natureza, ler, pintar, dançar, estar com os amigos, etc);
- Escreveres sobre o assunto para libertar “o fardo”;
- Fazeres afirmações positivas (A Louise Hay[4] tem livros e vídeos no Youtube que te poderão ajudar);
- Trabalhares o teu autoconhecimento.
Quem já sofreu
de distúrbios alimentares sabe que existe sempre a possibilidade de recaídas,
assim como acontece com os transtornos aditivos, pois no limite procuram-se
suprir necessidades de segurança, afeto, reconhecimento acabando por se preencherem
vazios de forma rápida para atenuar a dor daquilo que não queremos sentir. Dói
e causa sofrimento olhar para o problema e aceitar que não estamos sempre
alegres e felizes mas quando escolhemos respeitar este Templo chamado CORPO,
quando escolhemos honrá-lo ganharemos alegria de viver e resgataremos o nosso
propósito nesta vida.
A boa notícia é
que é possível sairmos da espiral fazendo as escolhas certas. É possível curar
as feridas emocionais que conduzem a este flagelo, é possível voltarmos ao
equilíbrio dos nossos corpos físico, emocional, mental e energético e para isso
precisamos de estar dispostos à mudança. ACREDITA!
Nota final:
Reforço que este post não substitui a procura de ajuda especializada na
prevenção e tratamento de um distúrbio alimentar.
Teresa
Peral
[1] Cordás,
T. (2004). Transtornos alimentares: classificação e diagnóstico. In Rev. psiquiatr. clín. vol.31 no.4 São
Paulo 2004, Recuperado de http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-60832004000400003&lng=en&nrm=iso
[2] Carmo,
I. (2016). Isabel do Carmo fala de anorexia. In Mulher Portuguesa Recuperado de https://www.mulherportuguesa.com/pessoa/entrevista/dra-isabel-do-carmo-em-entrevista-a-mulher-portuguesa/
[3] Chopra,
D. (2014). Tem fome de quê? 1ª Ed.
Amadora: Editora Nascente
[4] Louise
L. Hay era uma notável conferencista e uma autora de prestígio internacional e
publicou dezenas de best-sellers sobre auto-ajuda e meditação.
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