quinta-feira, 25 de janeiro de 2018

Círculos de Mulheres para mulheres contemporâneas

Era uma vez uma menina que não suportava calças e muito menos cabelo cortado à le garçon...!

Recordo-me (desde sempre) que a reverência ao feminino era (e é) um aspecto muito presente na minha vida. Expressava-o, de forma inconsciente, através dos desenhos alusivos ao feminino, através da roupa que vestia (saias e vestidos), através da necessidade imperativa em manter o meu cabelo comprido (as minhas antenas!). A expressão de uma identidade assumidamente feminina e que me lembra do prazer em Ser e Sentir-me Mulher.

O padrão familiar do qual provenho é marcado por uma linhagem de mulheres matriarcas cuja atitude apreendida foi a da mulher trabalhadora, educadora dos filhos, a que está na linha da frente na resolução de problemas de toda a ordem e a de achar que a ajuda de um homem era menos relevante. Neste sistema familiar o padrão vigente foi sempre o de mulheres que tiveram de tomar decisões importantes e em muitos momentos não se permitiram mostrar fragilidade (embora a sentissem). Herdei, em alguns aspetos, este lado matriarca e o trazer para mim muitas responsabilidades que não soube partilhar e gerir nos relacionamentos conjugais que vivi custando-me, entre outros fatores, o final dessas relações.

Entre muitas vivências doridas e outras prazerosas escolhi sempre extrair as aprendizagens. Umas vieram mais rápido e outras mais lentamente pois integrar mente (pensar) e coração (sentir) nem sempre é tarefa fácil.

O meu processo de cura e de despertar para o Sagrado Feminino iniciou, conscientemente, em 2016 após vivenciar o luto de uma relação. Senti nessa altura o chamado para integrar um clã de mulheres denominadas de Guardiãs do Ventre e do Sagrado Feminino [1]onde acredito ter dado início ao resgate do meu feminino sagrado.

Imagino que estejam a perguntar o que é o Sagrado Feminino?

Convido-te a interromper a leitura por alguns instantes e responder a ti mesma/o o que representa o Sagrado Feminino para ti? Não há respostas certas ou erradas...

Para mim representa escutar a intuição, a minha sabedoria interna, despertar para os mistérios da Vida. O aceitar a fragilidade e, simultaneamente, reconhecer e assumir o meu lado selvagem.

Ressalvo que o movimento do Sagrado Feminino não é igual a Movimento Feminista (e nada contra!) mas se quisermos uma definição poderá dizer-se que é “o resgate de uma consciência antiga que nos retorna aos valores de nós mulheres num todo, social, pessoal, psicológico, religioso, cultural, além de uma busca pela atitude ecologicamente correta” (2018, Gaya)[2]. 

Ainda em 2016 uma amiga incentivou-me a facilitar um Círculo de Mulheres. Em cada Círculo de Mulheres[3] tive a oportunidade de me colocar ao serviço de outras mulheres, assumindo o compromisso firmado quando me tornei guardiã do ventre. Senti e sinto um verdadeiro retorno a casa. Algo que inexplicavelmente vem de dentro e que transcende os aspetos racionais. Crê-se que os Círculos sempre existiram como práticas em sociedades regidas por um regime social de parceria e comunhão entre si e com a natureza. Após reunir algumas ferramentas e a confiança necessária facilitei o meu primeiro círculo e a seguir a esse vieram outros 14 círculos que se revelaram maravilhosamente enriquecedores...


Quando as mulheres se sentam em roda o sentimento de união e de igualdade emerge (não há uma hierarquia), estamos de igual para igual a partilhar as feridas emocionais num ambiente seguro e isento de julgamento. Estas feridas resultaram de um passado marcado por uma civilização patriarcal em que as mulheres se tornaram competitivas e desligadas da sua essência.

Da experiência que tenho vivido posso partilhar que as emoções e conexão que se experimenta num círculo é algo de poderoso e transformador. A cumplicidade flui, o espaço para a partilha surge, as dores atenuam e lembramo-nos que não estamos sozinhas na Caminhada. Em cada círculo choramos, dançamos, abraçamo-nos, confidenciamos histórias, pintamos, rimos, cantamos, lembramos a doçura de se ser Mulher. Honrar a benção que nos está a ser concedida.

Realço que o objetivo deste artigo não é crucificar os Homens nem gerar a divisão, pelo contrário, é compreender que também os homens carregam as suas feridas e que se trabalharmos para equilibrar estas polaridades (feminino, masculino) em nós, por certo estaremos a contribuir para a criação de uma sociedade mais amorosa em que as relações mulher-homem possam ser harmoniosas e curadas lado a lado. Em Portugal já se facilitam Círculos de Homens onde também é possível trabalhar o resgate do Sagrado Masculino[4]  e Círculos Mistos (Homens e Mulheres) [5]

O meu objetivo é lançar a semente para a compreensão do que representa o Sagrado Feminino e a importância dos Círculo de Mulheres para as mulheres contemporâneas em que me comprometo em levar este propósito mais longe!

Convido-vos a procurarem participar num Círculo de Mulheres perto de vocês, por certo que encontram e sintam a experiência tirando as vossas próprias conclusões!


Lembrar, por fim que “é através do regresso ao Círculo e à liderança circular que iremos transformar a nós mesmas e ao mundo pois é nele que se encontram as chaves para a União de todas as partes (2018, Inês Gaya)


Aho!


[1] As Guardiãs do Ventre e do Sagrado Feminino representam um clã de Mulheres que têm como propósito assumir um papel ativo no despertar do Sagrado Feminino.
Este Clã está ligado pela missão de Empoderar e Educar mulheres e homens, repondo a verdade e curando as feridas de um passado marcado por uma energia excessivamente castradora e patriarcal. Fonte: Gaya, Inês (2016). As Guardiãs do Ventre e do Sagrado Feminino In Manual Guardiãs do Ventre e do Sagrado Feminino.
[2] Sagrado Feminino. Fonte: (2018) Gaya, Inês. Sabedoria Ancestral para Mulheres Contemporâneas In Manual Formação de Guardiãs de Círculos Feminos

[3] Círculos de Mulheres – São encontros em que mulheres se reúnem e partilham as suas dores, as suas feridas emocionais com um propósito comum: Se reconectar com a sua essência feminina resgatando o seu sagrado feminino e melhorando e curando as suas relações com todos e com tudo o que a rodeia.





Teresa Peral

quarta-feira, 10 de janeiro de 2018

Reduzir

Vivemos rodeados de objectos, de móveis, de equipamentos electrónicos, de roupa, de tralha. Tralha que nos vendem como indispensável, como a última novidade, como o segredo para a felicidade. São equipamentos informáticos que ficam desactualizados a partir do momento em que os compramos, são as épocas de saldo (quatro por ano) que nos impulsionam a comprar roupa que nunca vestimos, é a publicidade que nos entra pelo cérebro adentro de todas as formas possíveis e imaginárias, e agora publicidade dirigida, através dos nossos perfis sociais públicos, impulsos vários para consumir coisas de que não precisamos e nos fazem viver rodeados de excesso e desperdício.

Fecho os olhos e respiro fundo, recuo três décadas, e estou em casa dos meus avós, onde passei muitos meses de férias numa casa onde existia muito menos e onde me senti sempre deliciosamente bem. Onde abundava aquilo que verdadeiramente faz falta. Espaços simples e arrumados, espíritos leves e felizes, visitas diárias de amigos, sorrisos, muitos sorrisos e uma mesa sempre posta, que convidava a sentar e ficar! Onde não me recordo de ver coisas que não eram utilizadas, tudo, absolutamente, tinha um propósito. A roupa de ambos cabia num só roupeiro bem mais pequenino do que os que utilizamos actualmente, o armário da casa de banho era minúsculo e continha todos os produtos de higiene necessários, o frigorífico onde nada se acumulava e onde a comida nunca se estragava. Podia continuar num rosário de exemplos …



Na última década confrontei-me com o meu próprio excesso e consumo desnecessário e acumulação de coisas que não me serviam absolutamente para nada. Coisas que enchiam gavetas, móveis, roupeiro e até o armário da casa de banho estava a rebentar pelas costuras, parecia servir uma turma de 30 pessoas. No fundo tentava preencher a alma, sem sucesso claro, ela não gosta de tralha, muito menos daquela inútil. Mas isso tenho vindo a descobrir devagar. Desde miúda que as casas me fascinam e adoro decoração e mudanças, não sei dizer quantas vezes mudei a casa dos meus pais enquanto vivi com eles e mais tarde a minha própria casa. Há uma frase famosa de Coco Chanel: "A woman who changes her hair is about to change her life", isto é, "uma mulher que muda o cabelo está prestes a mudar a sua vida", no meu caso acontece com os móveis, camas, mesas e sofás.

É incrível a quantidade de tralha da qual nos rodeamos que não serve absolutamente para nada, a não ser para nos dar trabalho a manter e limpar. Ou porque achamos que um dia podemos precisar, ou porque nos deram e temos pena de nos desfazer, ou porque pagámos caro e agora não sabemos despedir-nos, enfim uma lista infinita de motivos que nos leva a acumular, guardar e manter coisas que não só não nos fazem falta como nos causam prejuízo. Viver num espaço desorganizado, confuso e cheio torna-nos desorganizados, confusos e cheios e vice-versa, estados de espírito confusos tornam os ambientes confusos. De forma muito subtil esta tralha inútil afecta a nossa qualidade de vida.

Reduzi drasticamente a tralha lá de casa. Vendi candeeiros e móveis, dei roupa e objectos de decoração a amigos e instituições, mandei fora papéis, facturas, contractos, manuais de instruções e revistas que nunca mais iria utilizar. Só não consegui abrir mão dos livros, esses são património sagrado. Despachei tudo aquilo que não me dava alegria ou satisfação. A minha casa e a minha vida ficaram muito mais simples e bonitas. Ficaram as peças que adoro e utilizá-las é agora não só mais frequente como muito mais prazeroso. Vestir-me de manhã deixou de ser um pesadelo, no meu roupeiro só estão peças que adoro e consigo ver todas!

De forma mágica tenho vindo a descobrir aquilo de que realmente gosto e que faz sentido para mim. Faço escolhas muito mais ponderadas e sensatas antes de uma compra. Agora, comprar é um acto certeiro, cirúrgico e muito menos frequente. Viver com menos aumenta e enriquece o espaço e o tempo para fazer as coisas que verdadeiramente nos satisfazem!


PS – Deixar ir aquilo que não nos serve e não nos satisfaz não é desperdício. Desperdício é manter-nos presos a coisas que nunca iremos utilizar.

Rita Carreto
ritatoscanocarreto@gmail.com